sexta-feira, 12 de outubro de 2007


Em um show de talentos, um gordinho, tímido e desajeitado, chega em um terno alguns números menores, aparência simples de um vendedor de celulares.

_O que vai fazer? - pergunta uma entediada jurada

_ Cantar Ópera.... responde o visivelmente nervoso cantor.

Os jurados se entreolham em deboche. Mndam iniciar.


Paul Potts abriu seu coração, e soltou a mais linda e afinada voz, em um interpretação corretíssima de "Nessum Dorma". A jurada foi às lágrimas, os jurados estão estupefatos...

Semanas depois, Paul Potts vence o programa "Britain´s got Talent", e canta para a rainha Elizabeth II, grava um CD, já está em mais de 500 mil cópias vendidas.


Essa fábula moderna é vista no You Tube, e mostra o quanto os tesouros de cada um de nós podem estar completamente inaparentes para todos.

Talento não se adquire: Se nasce com.


Que eu nunca desanime alguém de seu sonho... pode ser um Paul Potts!


sábado, 1 de setembro de 2007

Dona Glória

Quando passei a ser um dos auditores do hospital, alguns problemas foram passados. Foi aí que conheci Dona Glória. Paciente considerada problema pelo seu gênio irrascível, sua língua afiada e sua fantástica capacidade de gerar desafetos. Logo conseguira brigar com uma equipe inteira de médicos, ser detestada pela Enfermagem, que ela humilhava regularmente. Não havia uma só pessoa que ela não brigasse.
Fui conhecer Dona Glória, no intuito de transferi-la para um dos Lares do Hospital, visto ser uma senhora lúcida, 80 anos, sem nenhum familiar vivo, amigo ou parente, com um irritante defeito de fala, como se falasse todas as palavras iniciadas com “T”.
Como seu tratamento era crônico, e poderia ser feito em casa, desde que tomasse os remédios, passei a acompanhá-la.
E foi em uma tarde, em meio a uma torrente de frases e assuntos, que percebi, que além de insuficiência cardíaca e diversas patologias, seu problema era tão visível que chegava a ser gritante. Dona Glória padecia de carência.
A mais pura, a mais intensa, a mais cruel solidão a fez se tornar irrascível. Passei quase uma hora sentado ouvindo-a. Contava em ritmo apressado, como se tivesse que colocar todos os acontecimentos de décadas, em minutos. Falava como alguém que nunca falara antes, falara como se vomitasse as palavras, como se as frases lhe surgissem em erupção, contava sua vida, sua história, a de seus pais, a de conhecidos. Sempre numa velocidade estonteante, com uma disartria cheia de “T´s”.
No meio da erupção de palavras, percebi que seu coração físico tinha vários problemas, mas o coração emocional estava sufocado, pedindo socorro.
Vi Dona Glória sorrir pela primeira vez, três dias após a nossa primeira conversa. Sorria e me agradecia. Mesmo eu tendo de deixá-la por último, devido ao enorme tempo de visita que despendia.
Enquanto ela falava percebi como nós, os seres humanos, só desejamos um pouco de atenção, de carinho, de um desabafo. E por trás da irrascível, louca, senil, e dos diagnósticos, havia um coração sufocado.
Sei que ela jamais voltará para a casa que morava, pois fora invadida por traficantes, e agora, seria demolida pela Prefeitura. Cabe a ela morar em um Lar Geriátrico, onde possa ser ouvida.
Em 15 anos de formado, ainda tenho muito a aprender, e cada um que passa, ensina algo, ou relembra algo já aprendido e adormecido nos arquivos da mente.
Dona Glória está melhorando, e logo vou visitá-la.
Ela me ensinou um pouco mais sobre Medicina...

quarta-feira, 29 de agosto de 2007

40 Anos

Bom, cheguei aos 40 anos. Meia-idade, meio estranho. Pensar em 40 aniversários, em 40 Natais, em tantas memórias, que, no entanto parecem muito recentes é bem estranho.
Já tive meu primeiro emprego, e um segundo, e um terceiro... Já tive o primeiro diploma, o segundo... Já tive a primeira mesa de trabalho, a segunda, e perdi a conta de quantas outras. Sendo médico, não tenho idéia de quantos pacientes atendi na minha vida, não tenho idéia de quantos livros li, de quantos filmes vi, de quantas músicas ouvi.
Tudo me parece recente e novo, apesar da tal idade. O tempo passa indiferente a você, um dia você acorda e está com 40 anos. Mudam valores. Mudam idéias, mudam perspectivas. Tudo em um estalo de dedos de quem tinha 18 anos ontem. Fecho os olhos e me vejo em uma boite distante, dançando ao som de músicas que hoje tocam em flash-backs nas rádios. Fecho os olhos e lembro de meus discos de vinil, de coisas simples de um mundo menos tecnológico.
Fiz trabalhos de escolas na Olivette Lettera, uma máquina de escrever portátil, que era um luxo! ... e que eu detestava! Não existia Word, Microsoft, nem Bill Gates bilionário.
Quando errávamos ou era o lápis borracha, que se bobear rasgava o papel, ou um papelzinho branco, chamado “Toque Mágico”, bastava colocar o papelzinho e voltar o carro da máquina e bater por cima. Disso não tenho a mínima saudade, adoro tecnologia, adoro carregar meus discos no meu mp3, gosto da praticidade.
E se antes era solteiro, agora, casado, tenho um filho de 8 anos, que espera muito de mim. E mais uma vez todo o referencial muda.
Acho que não se conhece o REAL e mais PURO significado da palavra “AMOR”, até você ter alguém te chamando de “Papai”. Esse AMOR é o único verdadeiro, o mais intenso e devastador, o mais querido e forte sentimento.
Mas como assim?!
Eu ainda chamo meu pai assim.
E a vida vai passando na janela, e eu vivendo, observando e contando. Mudaram os valores, mudou o blog.
Acabou o Coisas de Tio (http://coisasdetio.zip.net), iniciou o “Anos de janela”.
Muitos anos ainda devem passar, mas o que quero é viver.
Viver para contar. E vc é meu convidado a olhar o mundo. Pela janela.